Por razões de força maior, o Café Margoso vai encerrar durante 30 dias. No dia 22 de Julho, voltará, se houver forças e ânimo para tal. É muito provável que hoje este estabelecimento atinja as 100 mil visitas e por isso agradeço em primeiro lugar a todos os leitores, colaboradores, comentadores e apreciadores pela presença assídua ou pontual, crítica atenta e pelo carinho e amizade. Sejam felizes e aproveitem a vida. Abraço fraterno.






as héveas murcharam
desertas de folhas
desertas de flores

propositadamente
nem só o sangue mas também a seiva
nem só a criança mas também a pétala
nem só o homem mas também a planta
nem só a carne mas também a lenha
propositadamente

tudo o hamadricida flagelou

a beleza da flor
a inocência da criança
a certeza dos campos
o aconchego duma sombra

mas nos covis a vida continuou
e o apelo à luta redobrou

as héveas murcharam
e com as héveas
a manhã inflor
a terra nua

mas ainda a vida
nos covis continua

Osvaldo Osório




Para todos que, como eu, também consideram Chico Buarque o nome maior da música popular brasileira. Completou ontem 65 anos.



Bom fim-de-semana







Ironias do destino?





Se vivesse nos Estados Unidos, onde ter consultas de psiquiatra é tão natural como ir ao dentista, eu seria cliente pela certa. Enervo-me com demasiada facilidade, sou tão susceptível ao elogio quanto à crítica, mesmo quando sinceros e bem intencionados, e sou incapaz de, numa primeira reacção, rir-me do insulto gratuito de fantasmas psicóticos com nicknames terroristas. Por isso digo também que o tempo, esse que faz com que depois de um segundo venha o outro é, de longe, o meu maior aliado, em todos os sentidos. 

A reacção de amigos ou conhecidos à última crónica desaforada provocou-me toda uma tempestade de emoções. Primeiro fiquei algo revoltado. Há pessoal que não consegue viver sem dar e receber à bruta. "Já sabes como eles são, porra!" Pois! Tentei escrever uma declaração logo pela manhã, depois outra à tarde, mas felizmente tomei a decisão de esperar e deixar o tempo fazer-me encontrar o bom senso que tantas vezes me falta em cima do acontecimento. A verdade é que nada disto tem muita importância. Considero que está tudo tão claro no que escrevi e tenho escrito, agora e no passado recente, sobre o actual estado da política cultural em Cabo Verde,  que nem vale a pena estar a ripostar arrojos grosseiros com citações de frases e ideias que qualquer um pode ler, dois post's abaixo.

Tenham lá calma, curtam o fim-de-semana que Deus falha mas não tarda, ou no mínimo, escreve direito por linhas tortas, o que é o mesmo que dizer, para quem acha que Deus não tem nada a ver com este enredo, que há que manter a esperança, que por natureza é a última a morrer. Esperança de que havemos de ter a língua nacional cabo-verdiana oficializada, as crianças aprendendo a ler e a escrever na escola as mesmas primeiras palavras que aprenderam em casa, uma política cultural decente, corajosa, arrojada, forte e coerente com os pergaminhos de quem faz da arte e da cultura uma forma de vida e que, se todos quisermos, Cabo Verde será amanhã um país melhor do que é hoje. No dia em que deixar de acreditar nisso, deixo de lutar e passarei a gastar o tempo que me resta a produzir pouco em muito tempo, e o muito tempo que certamente me irá restar, será gasto a maldizer aqueles que com pouco, muito conseguem fazer. 

Fotografia: Jim Fiscus





Clica-me!

(Nicole Scherzinger)




Uma entrevista esclarecedora

1. Nada me move, a título pessoal, contra Manuel Veiga, titular da pasta da Cultura do Governo de Cabo Verde desde 2004. Antes pelo contrário, sempre que nos temos encontrado em várias situações, sempre foi educado, simpático e nunca transpareceu da sua parte qualquer inimizade pela minha pessoa ou alguma atitude que me pudesse ter feito embirrar com o homem por alguma razão especial;

2. Já fui seu anfitrião duas vezes, na primeira das quais foi assinado um protocolo entre o Ministério da Cultura e a Associação Mindelact, a segunda no encerramento do festival Mindelact do ano passado, onde o ministro, tal como já aconteceu em várias outras situações, teceu rasgados elogios à obra que esta associação cultural vem desenvolvendo em prol das artes cénicas no país;

3. Por me interessar especificamente e de forma empenhada por assuntos relacionados com aplicação das políticas públicas para a área da cultura aceitei ainda o amável convite que me foi endereçado pelo seu ministério para participar no Fórum da Economia da Cultura em Outubro passado e nele participei de forma activa, empenhada e construtiva, como dei conta nesta crónica;

4. Finalmente, procuro em todas as críticas que faço, evitar uma postura destrutiva, azeda ou demasiado tempestuosa, procurando, pelo contrário, escrever de forma fundamentada as análises que neste espaço foram sendo feitas sobre política cultural, em geral, e sobre a actuação deste ministro, em particular;

5.  Dito isto devo dizer que achei a grande entrevista que o Ministro Manuel Veiga concedeu ao jornal A Nação bastante esclarecedora e a principal conclusão que podemos tirar não é novidade para ninguém: estamos perante um linguista de excepção, com o qual podemos não concordar, mas que está, sem qualquer sombra de dúvida, absolutamente preparado para defender as suas ideias nesta área;

6. O seu discurso em defesa da língua cabo-verdiana é claro, directo e não deixa margem para muitas dúvidas. Reflecte, como é óbvio, a obra extraordinária que possui na defesa da língua cabo-verdiana e tira as dúvidas que possa haver em relação a muitos dos equívocos que vem alimentando a sociedade cabo-verdiana nesta questão basilar da oficialização do crioulo;

7. Manuel Veiga mostra, nesta entrevista, e no que ao crioulo diz respeito, não só capacidade de argumentação. Mostra também humildade e jogo de cintura perante a onda de críticas. Fala num processo em construção, quando os críticos insistem na imposição; defende a pluralidade de opinião, quando os críticos falam em autismo propositado; está aberto a propostas e refere que no processo de padronização do alfabeto - que não da língua - todos são livres de usar e defender outros modelos, mas que seria bom que os sustentassem cientificamente, o que até agora não aconteceu;

8. Também concordo com o Manuel Veiga quando ele fala de equívocos referentes ao Alfabeto  cabo-verdiano, sendo certo que se alguns destes equívocos são provocados por pura ignorância ou vontade de provocar confusão deliberada à custa de bairrismos exacerbados, também é verdade que isso acontece porque a proposta agora aprovada não foi socializada, nem sujeita a amplo debate, o que poderia ter evitado o que está acontecer hoje na sociedade cabo-verdiana;

9. Não nos enganemos: os cabo-verdianos estão não só profundamente divididos, como completamente desinformados. Basta ir a qualquer fórum onde este assunto venha à baila para se verificar o nível do debate e a profunda ruptura que está a provocar entre cidadãos de uma mesma Nação, livre e independente já lá vão 35 anos, que pensa, sonha e ama em crioulo mas é incapaz de perceber que não faz sentido não dar um estatuto mais amplo, sistematizado e premente à sua própria língua materna;

10. E aqui chegamos à segunda conclusão da entrevista: Manuel Veiga tem falhado como Ministro da Cultura não apenas na aplicação das políticas da área, mas especificamente nesta que é a sua vertente de eleição: a oficialização da língua cabo-verdiana. Porque se há falta de informação, de debate, de esclarecimento, de procura de consensos mais amplos, de consultas, de conferências, de colóquios, ou seja, de socialização desta questão central, à inèrcia deste ministério o devermos e não fosse assim não estaríamos hoje com o mesmo nível de debate que existia há 15 anos atrás, quando se discutiam os excessos de chapéus e sinais do crioulo escrito e, curiosamente, com o mesmo protagonista;

11. Quando este ministro foi empossado, em 2004, nos discursos da praxe, e com o entusiasmo natural de quem vê um dos maiores linguistas da nossa historiografia assumir um cargo onde poderia, finalmente, colocar em prática tudo o que vinha defendendo nos circuitos académicos e intelectuais, foi dito, alto e bom som que "crioulo vai passar a ser língua oficial em Cabo Verde em 2005" (aqui). Passaram-se quatro anos e quase tudo está por fazer;

12. Sendo certo que esse amplo debate não pode estar confinado ou dependente apenas da vontade de um ministro e do seu gabinete, também não se pode assobiar para o lado e dizer que este não deve ser responsabilizado pela situação que vivemos hoje. Porque muito mais podia e devia ser feito a este nível, e num assunto onde, como se referiu atrás, o ministro domina a seu bel-prazer, com capacidade técnica, teórica e de argumentação acima da média, maiores são as suas responsabilidades políticas;

13. Além da forma pouco elegante como insinua que algumas das críticas feitas ao seu ministério surgem motivadas por ambições pessoais ou por falhadas expectativas de apoio instituicional, todos os outros assuntos abordados na entrevista confirmam a segunda conclusão: a política cultural, que ninguém sabe qual é, continua emersa num lodo estratégico que balança entre os acontecimentos casuísticos, as homenagens pontuais, a economia da cultura que continua por explicar e/ou definir, os planos estratégicos anunciados que nunca viram a luz do dia, a confiança (natural) nos seus mais directos colaboradores e a utilização de termos bombásticos, ontem o diamante do país, hoje o oxigénio da educação. 

Nota final: desejo, com toda a sinceridade, que no próximo dia 22 de Junho, a Cidade Velha de Ribeira Grande de Santiago possa vencer essa imensa batalha e transformar-se em Património da Humanidade para que possamos dar, por esse intermédio, uma importante vitória ao actual ministro da cultura. Porque acima de tudo, continuo acreditar que ele só quer o bem do país e está a fazer o melhor que sabe e pode. E digo isto sem qualquer ponta de sarcasmo ou de ironia.


Mindelo, 19 de Junho de 2009


Imagem: Ta sumara um aiam de Mito





Afinal, é dos humildes que o povo gosta mais?


À melhor resposta, ofereço um café



"A partir de agora, não poderão dizer 
que Obama nunca fará mal a uma mosca."

Marco Santos - Blogueiro do Bitaites

(Para entender porquê, basta ver isto)



Falta uma semana para a estreia, mas o certo é que vem aí...
...uma nova fornada de actores e actrizes!




De 25 a 28 de Junho, serão 8 espectáculos, com apenas 50 espectadores de cada vez. Entrar no Jardim do Dr. Gordner Bricker vai ser como entrar num comboio fantasma...



Não vi, mas foi um amigo que me avisou, entusiasmado: "sabes qual foi a primeira frase que disse o Primeiro-Ministro de Portugal, na grande entrevista que deu hoje à SIC?" Não sabia, evidentemente. Mas ele disse-me. E eu pensei cá com os meus botões, espero que os dois primeiros, o de cá e o de lá, tenham falado deste assunto na última visita que fez ao arquipélago! 

Ah, a frase foi esta:

"Se há um erro que é possível identificar ao longo destes anos é que talvez deveríamos ter investido mais em cultura."

Se penso que isto vai mudar alguma coisa? Não sei. Mas com a tendência que temos de copiar modelos da antiga metrópole não seria mau ler esta frase e ver a sua possível aplicação à realidade cabo-verdiano. 

Ilustração: "Opportunity" de bexe




Como eu desejo a que ali vai na rua,
tão ágil, tão agreste, tão de amor...
Como eu quisera emaranhá-la nua,
bebê-la em espasmos de harmonia e cor!...

Desejo errado... Se eu a tivera um dia,
toda sem véus, a carne estilizada
sob o meu corpo arfando transbordada,
nem mesmo assim, ó ânsia!, eu a teria...

Eu vibraria só agonizante
sobre o seu corpo de êxtases dourados,
se fosse aqueles seios transtornados,
se fosse aquele sexo aglutinante...

De embate ao meu amor todo me ruo,
e vejo-me em destroço até vencendo:
é que eu teria só, sentindo e sendo
aquilo que estrebucho e não possuo.

Mário de Sá-Carneiro




"As folhas secas cobrem em abundância o caminho das recordações."

James Joyce - Escritor irlandês


(Ontem, comemorou-se o Bloomsday, um feriado comemorado na Irlanda em homenagem ao livro Ulysses, de James Joyce. É o único feriado em todo o mundo dedicado a um livro não sagrado.)




A Margarida volta à carga para lembrar o absurdo deste concurso (aqui), já referido também no Café Margoso (aqui). Desta vez, encontrei no blogue de Rui Simões, Der Terrorist, este comentário:

"Nesta “coisa” das 7 Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo, uma das “maravilhas” a concurso era a Cidade Velha de Santiago em Cabo Verde, cidade que «nasceu e desenvolveu-se por conta do tráfico negreiro», vulgo comércio de escravos. Há bocado ouvi na RTP1 uma menina referir a Cidade Velha de Santiago como “importante entreposto humano”. Assim mesmo. E assim vai a História de Portugal e assim vai a nossa relação com a nossa História."

Realmente, quando a televisão pública portuguesa tem gente que escreve e utiliza na antena termos como "entreposto humano", referindo-se ao tráfico escravo com a mesma leveza com que fala de um supermercado do Continente, está tudo dito.

Bela imagem do 25 de Abril de 1974. Quem será o crioulo que observa a cena com tanto interesse?



Fonte: aqui




Encontrei este texto do jornalista brasileiro Arnaldo Jabor e que mesmo indo no sentido contrário do que toda a gente sabe, não deixa de ser bom de se ler para quem largou o ginásio há alguns meses por falta de tempo e, mais decisivo, por pura preguiça. Foi um bom momento para atenuar os meus problemas de consciência, sendo certo que o facto de não ter carro e me deslocar a pé para todo o lado - o que numa cidade como o Mindelo não é nenhuma proeza por aí além, diga-se de passagem - também ajuda a compensar este período mais tranquilo, para não lhe chamar outra coisa. 

Então é assim

Barriga é barriga, peito é peito e tudo mais. Confesso que tive agradável surpresa ao ver Chico Anísio no programa do Jô, dizendo que o exercício físico é o primeiro passo para a morte. Depois de chamar a atenção para o fato de que raramente se conhece um atleta que tenha chegado aos 80 anos e citar personalidades longevas que nunca fizeram ginástica ou exercício – entre elas o jurista e jornalista Barbosa Lima Sobrinho – mas chegou à idade centenária, o humorista arrematou com um exemplo da fauna: A tartaruga com toda aquela lerdeza, vive 300 anos. Você conhece algum coelho que tenha vivido 15 anos?

Gostaria de contribuir com outro exemplo, o de Dorival Caymmi. O letrista compositor e intérprete baiano era conhecido como pai da preguiça. Passava 4/5 do dia deitado numa rede, bebendo, fumando e mastigando. Autêntico marcha-lenta, levava 10 segundos para percorrer um espaço de três metros. Pois mesmo assim e sem jamais ter feito exercício físico viveu 90 anos.

Conclusão: esteira, caminhada, aeróbica, musculação, academia? Sai dessa enquanto você ainda tem saúde… E viva o sedentarismo ocioso!!! Não fique chateado se você passar a vida inteira gordo. Você terá toda a eternidade para ser só osso!!!

Então: não faça mais dieta! Afinal, a baleia bebe só água, só come peixe, faz natação o dia inteiro, e é gorda!!! O elefante só come verduras e é Goooooordo!! 

Viva a batata frita e o chopp!!

Você, menina bonita, tem pneus? Lógico, todo avião tem!
E nunca se esqueçam: ‘Se caminhar fosse saudável, o carteiro seria imortal


Via: aqui






Esta semana o nosso destaque vai para o blogue Communicare, um interessante espaço dinamizado pelos alunos da Licenciatura em Ciências de Comunicação da Universidade Lusófona de Cabo Verde, que além deste blogue, têm organizado palestras e conferências sobre os mais variados temas. Dizem-se, acima de tudo, "unidos para um futuro de maior profissionalismo e qualidade da comunicação social, apoio à gestão de empresas e em tudo o que abarca a comunicação." 

Numa altura em que se tem falado tanto de Ensino Superior em Cabo Verde e de déficit de cidadania é bom verificar que um conjunto de alunos não encara a sua instituição de ensino apenas como um caminho para obter um canudo. É o meu Café da Semana e pode ser consultado, aqui.






100 é um número redondo, quase perfeito. Não é por acaso que se comemoram centenários com toda a pompa e circunstância. Sejam de nascimento, de morte ou de algum acontecimento histórico relevante. Fazer 100 declarações, dizendo o que se pensa, porque se pensa e fundamentando essas tomadas de posição, tendo ou não tendo razão nalgumas delas, merece, pois, a devida referência. 

Então declarou-se alto e bom som sobre aspectos tão pessoais como amar todos os diasas coisas boas da vidaos beijos e os abraçosa ternura dos 40, os malefícios do Verão ou a beleza das segundas-feiras; a falta de paciência para o Natal, o fenomenal reveillon do Mindelo, o sentimento de ser-se ateu e a visão macro e micro da vida. Como é bom ser pai, declarou-se, a páginas tantas! Como é estupidamente caro, ser info-incluído em Cabo Verde, chorou-se num outro dia. Ser homem é um desporto radical? Não sabemos, porque estas declarações procuram provocar o debate, mas na maior parte das vezes, trazem mais perguntas do que dão respostas. 

Falou-se de direitos humanos na China a propósito do Tibete; apelou-se à participação eleitoral e festejaram-se as vitórias de Barack Obama; denunciaram-se os desmandos do novo Papa e as palermices do economista crioulo que acha que ser gay é uma doença; reflectiu-se sobre a falta de interesse dos cabo-verdianos pela política e sobre guerras entre jornalistas de dentro e de fora; lamentou-se a situação na Guiné-Bissau, a guerra suja de Israel nos territórios palestinos,  

O Café Margoso comemorou as 25 mil visitas, deu corda aos Anónimos, declarou o que é um bom blogue e festejou o seu primeiro aniversário; fez-se a defesa intransigente da blogosfera crioula e esclareceram-se as razões que fazem o Café Margoso aquilo que ele é;  explicou-se porque é bom ter um blogue e lamentou-se a nossa falta de tomates; a análise ao 180º deu origem a muita reacção e o mundo seria melhor se a liberalização das drogas fosse uma realidade.

Enalteceu-se os Raiz di Polon e o Juventude em Marchao prazer de estar no palco, o dia mundial do teatro, a beleza de Santiago, as qualidades do inimitável IMac ou a forma como são ocupados os espaços públicos; estranhou-se a preguiça dos combustíveis em descer os preços, defendeu-se um cortar a mal pela raiz e reflectiu-se sobre a função social da Arte; denunciou-se o muro da vergonha do Mindelo, que ainda lá está, apoiou-se a fé do nosso primeiro no Mundo Novo a descobrir e estranha-se as fortunas gastas nos festivais de música; chora-se a degradação que "obriga" o aluguer de espaços públicos para cultos de seitas radicais e desconfia-se sempre que se utilizam argumentos bairristas para esconder outras realidades.

Do país falou-se de ensino superior, do caso Murdeira, de corrupção ou do nojo da pedofilia; arranjou-se uma confusão ao Vital Moeda, e declarou-se guerra aberta à violência doméstica; desconfia-se do fumo sem fogo como justificação da riola e grita-se não às bases militares estrangeiras em Cabo Verde; refletiu-se sobre o poder das máscaras na nossa sociedade, sobre as confusões alupekianas ou a falta de humildade artística.

Porque há licenciados desempregados, o local certo para uma orquestra sinfónica, o fenómeno Susan Boyle, a falta de sentido de humor ou o descaramento dos ladrões de electricidade dos bairros chiques da Praia, foram mais alguns dos assuntos levantados por estas declarações, quase sempre com cafeína. Qualquer dia lanço um livro com isto tudo. É a última coisa que me falta para poder ser considerado um blogueiro de pleno direito.




A bela arte de Peter Callesen









Galeria com os trabalhos do artista, aqui



«Cada vez há menos gente a votar; menos interesse nos resultados; cada vez os políticos se empenham menos. Começam a tratar os actos eleitorais como sondagens de luxo. E criticam-nas quando a abstenção é alta, apesar de terem ido votar todos os cidadãos que queriam.

A abstenção alta não é grave. Mas esta atitude é. Tratam o povo que se deu ao trabalho de ir votar (e que representa legitimamente o país inteiro, até ao último dedo do pé) como um petulante focus group. Votámos em partidos esquisitos só porque queremos "mandar uma mensagem". Ficámos em casa só porque estamos amuados. E o que mais irrita é a condescendência com que os derrotados admitem que sim, que até temos razão em estarmos chateados e que escusamos de continuar a fazer beicinho porque eles vão tratar disso já na segunda de manhã.

As eleições não são centros de recados nem fotografias dum instante político. Não são sondagens. Não são o Twitter. Se tratam as eleições como se não servissem para nada senão para informar, como é que depois podem queixar-se da abstenção ou até usar as eleições para se legitimarem? Cuidado.»

Miguel Esteves Cardoso, a propósito das últimas eleições europeias (fonte: aqui)


Sobre esta questão do voto, tenho a dizer duas coisas rápidas:

1. O único e verdadeiro voto de protesto é o voto em branco. A abstenção é um encolher de ombros, um lavar mão à Pilatos que depois não dá o direito a reivindicar rigorosamente nada. 

2. Por todas as razões e mais alguma, e tendo em conta a sociedade actual, sou totalmente a favor ao voto obrigatório, em detrimento ao voto por opção. 









Que legenda para esta imagem?

À melhor legenda ofereço um café




Que escrever no Livro de Reclamações 
do Governo de Cabo Verde?


À melhor resposta, ofereço um café



É uma boa notícia e mais um passo para a civilidade do nosso arquipélago: a partir de hoje já está disponível, e pela módica quantia de mil e duzentos escudos, o Livro de Reclamações, instrumento fundamental que dá voz aos consumidores dos estabelecimentos comerciais, incluindo os de hotelaria e restauração. A lei que a isso obriga, e que entrou em vigor a 28 de Maio de 2009, é um instrumento que permite aos consumidores cabo-verdianos exercerem o direito de queixa no local, por serviços inadequados.

O livro de reclamações, já à venda nos Correios do país e na Imprensa Nacional (IN), é obrigatório e deve ser disponibilizado por todos os fornecedores de bens e serviços. O governo justifica a obrigatoriedade deste livro com a necessidade de tornar mais rápida a resolução de conflitos entre os consumidores e os agentes económicos. O fornecedor “é forçado a disponibilizar gratuitamente ao utente o livro de reclamações sempre que este for solicitado e afixar um letreiro sobre a existência daquele instrumento no estabelecimento. É ele também quem deve remeter a queixa à entidade competente”.

Comentário Cafeano: Fiquei muito satisfeito com esta medida mas não deixei de me lembrar da época em que foi aprovada a lei que não só proibia a venda e consumo de bebidas alcoólicas a menores de idade como obrigava todos os estabelecimentos que vendem estes produtos, nomeadamente bares e restaurantes, a colocar uma placa com as medidas tais e tais, em local bem visível, fazendo referência directa à lei e à proibição. Nas primeiras semanas, era ver o pessoal todo a mandar fazer placas à medida, em todos os materiais, desde o metal e a madeira para os mais chiques, passando pela simples impressão em papel para os mais remediados, e a verdade é que nos primeiros meses tivemos uma inspecção zelosa a verificar se todos tinham a referida placa nos respectivos estabelecimentos e se de facto não se andava a vender bebidas alcoólicas a menores. Ora, passado algum tempo, não só as placas desapareceram da vista como bastaria uma saída à night mindelense durante este último fim de semana para se perceber que esta proibição não só é letra morta como o consumo está generalizado entre os jovens, tendo inclusive originado cenas contínuas de pancadaria e violência à porta de estabelecimentos de diversão nocturna. Esperemos que daqui a alguns meses não aconteça o mesmo com o livro de reclamações.




Clica-me!

(Scarlet Johanson)




Não basta um grande amor
para fazer poemas.
E o amor dos artistas, não se enganem,
não é mais belo
que o amor da gente.

O grande amante é aquele que silente
se aplica a escrever com o corpo
o que seu corpo deseja e sente.

Uma coisa é a letra,
e outra o ato,

– quem toma uma por outra
confunde e mente.

Affonso Romano de Sant'Anna


Pintura: Blue Lovers, de Chagall

Bom fim-de-semana




A Polícia Judiciária cabo-verdiana está em grande forma. Desde espectaculares apreensões de droga, caça a burlões, investigações rápidas e com resultados, é rara a semana em que não temos notícia de mais uma proeza da nossa CSI. A última novidade é a que nos diz que a PJ confiscou cerca de 350 milhões de escudos cabo-verdianos em bens móveis e imóveis em 2008. É muita massa e inclui valores de contas bancárias congeladas, bens imóveis arrestados e bens móveis apreendidos a pessoas ligadas à criminalidade organizada em Cabo Verde.

Da operação efectuada foram apreendidas vinte e três viaturas no decurso de 2008, de várias marcas e modelos, nomeadamente Toyota Avensis, Toyota Prado, Toyota Land Cruiser, WW Touareg e Mercedes, entre outras. Segundo a notícia da Inforpress a PJ já está a enfrentar problemas com o espaço para guardar as viaturas. Candidato-me desde já à guarda de um desses carrões, a bem da Nação, e que o tragam depressa, porque carro parado demora mais na hora do arranque.


Nem é preciso dizer mais nada...






"E enquanto tratava da minha vida

Andei-lhe a dar voltas à coisa. As mulheres não fizemos muitas revoluções, pois não, andávamos demasiado ocupadas. A coser-lhes as roupas e as feridas, a parir os filhos, a cuidar dos velhos, a enterrar os mortos, a tirar o véu, a encurtar a saia, a usar a pílula, a levar porrada do macho, a entrar sozinhas nos bares, a ser apontadas pelo pai, pelo irmão e pelo padre, a ser presas por abortar ou por abandonar o marido, a segurar os telhados, a caiar as paredes, a trabalhar no campo, a perder os pulmões e as forças nas fábricas, a ser a mula de carga, a companheira fiel, a amante fogosa, a mãe primorosa e incansável, a mulher-a-dias, a cem em um, a não faz mal que eu trato, eu faço, eu resolvo. Pois não, as mulheres não fizemos muitas revoluções, pelos menos para estes homens, colunistas, comentadores, taxistas e talhantes para quem as mulheres, com as suas lutas, as suas importantíssimas revoluções (domésticas, algumas, outras com cadáveres, muitas com demasiados silêncios) foram e continuam a ser invisíveis e pouco dignas. Ainda bem que andavam cá eles, a matarem-se uns aos outros. Isso é que eram grandes revoluções."


Rita Barata Silvério, aqui

Fotografia de Angie Chiara 




"Ronaldo podia alimentar 6,8 milhões de etíopes... 
...mas parece que se ficou pela Paris Hilton."

Jumento, reagindo à reacção do PAM à contratação de Ronaldo pelo Real Madrid





A propósito da última declaração cafeana sobre o aventureiro inglês. levantou-se um coro indignado, não com o texto propriamente dito, mas dando conta de uma nova perspectiva do problema. O inglês é um arrogante do caraças, pensa que isto aqui é a casa da joana, ou o quintal da casa dele, e teve o correctivo que mereceu! Mai nada! Qual direitos humanos qual quê?! Ele e os coitados dos senegaleses que caíram na conversa desse ridículo Indiana Jones, foram enfiados numa cela 10 por 10, onze gajos enfiados num espaço daqueles, sem direito a qualquer contacto com o exterior, durante seis dias! Ora toma que é para aprenderes!

Volto ao mesmo, justificar o nosso mal com o mal dos outros é fácil. O Abraão escreve que está tudo normal, já que "os polícias limitaram-se a proceder aos procedimentos de rotina", é assim mesmo, de rotina! Sinceramente, nunca pensei que as nossas forças de segurança já estivessem tão evoluídas. Então é assim: trata-se mal toda a gente, não são só os pretos que vem do continente! Se os cabo-verdianos tem o mesmo tratamento, estão à espera que estes gajos, uns bandidos, tenham tratamento de luxo? Fuck off! O Edson Medina declara alto e bom som para que "não nos tentem condicionar com o facto de sermos um país de emigrantes. Aplicou-se a lei, como em qualquer país." É assim mesmo! Qual Convenção de Genebra qual quê? Está tudo maluco?

Então, é assim mesmo: olho por olho, dente por dente. Os crioulos não são maltratados lá fora? Não são colocados em celas pouco condicionadas, humilhados, expulsos, como se fossem um bando de indigentes? Então, porra, somos ou não somos PDM? Não podemos tratar os aventureiros que aqui entram de forma ilegal de outra maneira! Estamos aprender muito bem a lição, não haja dúvidas!






Não se sabe se é apenas mais um golpe de marketing, mas anuncia-se aqui, para amanhã, Sábado, dia 13 de Junho, algures entre as 10h41 e as 12h23 (horas de Cabo Verde), o colapso definitivo da mais popular e fulgurante rede social do século XXI, que entre muitas outras coisas originais e insólitas, provocou o aparecimento de um novo verbo - o verbo Twittar - e novos hábitos, que obrigam a raciocínios inteligentes (ou nem tanto) de apenas 140 caracteres.

É o Twipocalipse: segundo os resposáveis, quando as mensagens no Twitter atingirem a aparentemente aleatória quantia de 2.147.483.647, o sítio pura e simplesmente sai da web. Sendo gratuito e não suportando qualquer tipo de publicidade, os analistas descrevem a situação do "micro-blogging", de que o Twitter é pioneiro, como pouco sustentável. Daí haver já quem veja o “Twitpocalypse” como golpe de marketing. Por via das dúvidas, como alerta o sítio da profecia, o fim avança a 198 tweets por segundo, "não marque férias para a data".

Estará a viver o mais famoso passarinho gráfico do planeta os seus últimos momentos de vida? Pelo sim, pelo não, nunca se sabe. Por isso, siga para a Pergunta Cafeana, mesmo aqui em baixo!



Deliciosa colecção de fotografias de Renne Maltete, cheias de humor e ironia:




"A Maioria"




"Santidade"




"Trabalho"


Ver galeria completa, aqui





Pandemia







Um filho da mãe acabado

- Sartre dizia que o Inferno são os outros...

- Isso é balela. Sabes o que é o Inferno, de facto? O Inferno é um lugar bom, o único Paraíso que existe é o momento imediato à saída do Inferno quando o Diabo permite ao danado ir tomar fresco lá fora. Só neste hiato ele está no Paraíso. É o momento do orgasmo, depois a mulher cheira mal, é puta e é feia. É claro que me refiro à mulher venal, as outras que me desculpem esta imagem. De facto, as mulheres, a literatura, o xadrez e o cinema são a minha sina.

- Com a atribuição do Prémio, temos agora o Arménio Camões ou o Conde continua ainda vivo?

- Não, o Conde não morreu. Agora o conde é reconhecido como Conde, agora até já tem corte! Ah, mas os reis é que costumam ter corte. Agora temos um Conde-Rei. 

- Como é que dirige a um Conde?

- O Conde é alteza, não é majestade. Agora se calhar é majestade ou o conde de todos os condes. Mas realmente eu sou conde, isso realmente é que foi o diabo: quando o meu primo foi vasculhar aqueles anais antigos, descobriu que a minha família é nobre, pelo lado materno. Portanto, não há dúvida nenhuma, sou garantidamente filho da minha mãe. Sou um filho da mãe acabado!

Excerto da entrevista de António Monteiro a Arménio Vieira, publicada no último Expresso das Ilhas.


Estão todos convidados, vamos lá conversar sobre isto.




Onde: Auditório da Universidade Lusófona
Quando: dia 12 de Junho / Sexta-feira / 21:00 horas







Este foi um caso estranho, mas grave. Estranho também que tenha sido tão pouco comentado na blogosfera, geralmente alerta para estes desmandos. Ao que parece, dez senegaleses e um aventureiro cineasta britânico, que quer dar a volta ao mundo da forma menos ortodoxa possível, foram caçados pelas autoridades a entrar ilegalmente em Cabo Verde, enfiados de imediato na esquadra de Eugénio Lima sem mais explicações, durante seis longos dias. Assim, sem piar. Aqui não se brinca. Afinal de contas queremos ou não queremos uma aproximação estratégica com a Europa? Agora que a guinada política à direita do rico continente comprovada nas eleições europeias do passado fim-de-semana é tão inquestionável quanto arrasadora, nada como ir experimentando algumas das metodologias anti-osmose tão ao gosto de certas ideologias defendidas por tipos como o senhor Berlusconi ou o senhor Sarkozi. 

Sinceramente não dá para entender que um país de emigrantes trate assim quem cá chega, mesmo (ou principalmente) quando se trata de pessoas sem os papeis em ordem. Além de que estamos a falar de senegaleses, cidadãos de um país vizinho, membro da CEDEAO e com quem, ao que parece, Cabo Verde tem um acordo de livre circulação. Claro que também ficou claro que se o destrambelhado do britânico que chegou com os restantes dez africanos não tivesse esperneado tanto, o caso seria mais ou menos abafado e poucos dariam pela situação, o que também é um péssimo sinal. 

Mas este é um caso para reflectir. E reflectir a sério. Cabo Verde não pode, por todas as razões e mais alguma (históricas, sociais, legais, geográficas, económicas e, claro, culturais) tratar a imigração ilegal desta forma absurda, além de que neste caso parece que foram violados os mais elementares direitos humanos e a própria Convenção de Genebra, quando se isolam indivíduos que não cometeram nenhum crime em território nacional, não mataram, não roubaram, não violaram e ficaram retidos durante vários dias sem sequer poder telefonar para nenhum familiar que nem sabiam se os seus estariam vivos ou mortos.  

Num momento em que o nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros se congratula com a decisão do Conselho Europeu de iniciar negociações para facilitar vistos aos cabo-verdianos (ler aqui), é chegado o momento de pensar se vamos agir para ser um exemplo no diálogo Norte - Sul ou se simplesmente vamos contribuir para a construção do muro que se quer construir para proteger a Europa dos "indigentes" africanos, voltando definitivamente as costas a uma das maiores heranças culturais e históricas do arquipélago. 



Mais um Passo Seguro








Que legenda para esta imagem?

À melhor legenda, ofereço um café.




O filme colombiano "Maria Cheia de Graça" do realizador Joshua Marston, retrata de uma forma crua e realista, o terrível martírio a que estão sujeitas mulheres que arriscam a vida no transporte de droga, da Colômbia para os EUA, utilizando cápsulas no estômago.

Nunca como agora, Cabo Verde esteve tão próximo dessa realidade. Nesta segunda-feira, a Polícia Judiciária prendeu quatro mulheres, de idade compreendida entre os 19 e os 31 anos, no Aeroporto Internacional da Praia, com cerca de 14 quilos de cocaína. 14 quilos! As mulheres, todas residentes em Santiago, acabavam de desembarcar de um voo proveniente de Fortaleza (Brasil). Segundo a PJ, a droga, com o peso exacto de 13.771 gramas, estava camuflada em cintas, caixas de cartão para embalar artigos comerciais, canecas térmicas e frascos de spray de barbear. O produto, proveniente do Brasil, tinha como destino a Europa. No mesmo voo, a PJ prendeu também um nigeriano com várias cápsulas de drogas no estômago. (Notícia aqui)

O mais triste nisto tudo é que só a raia miúda se arrisca e é presa. Quem manda nisto tudo continua impunemente, a passear-se nos seus últimos modelos automóveis importados e a viver nos seus castelos extravagantes. Seja como for, a nossa PJ está de parabéns, já que este tipo de apreensões se tem tornado cada vez mais frequente nas fronteiras cabo-verdianas e é digno de registo.