Esplana ou um poema de Luanda

2 Comments


      Naquele tempo falavas muito de perfeição,
      da prosa dos versos irregulares
      onde cantam os sentimentos irregulares.
      Envelhecemos todos, tu, eu e a discussão,

      agora lês saramagos & coisas assim
      e eu já não fico a ouvir-te como antigamente
      olhando as tuas pernas que subiam lentamente
      até um sítio escuro dentro de mim.

      O café agora é um banco, tu professora de liceu;
      Bob Dylan encheu-se de dinheiro, o Che morreu.
      Agora as tuas pernas são coisas úteis, andantes,
      e não caminhos por andar como dantes.

      Manuel António Pina


P.S. O belo e velho edificio colonial onde o Grupo Elinga Teatro desenvolveu o seu trabalho durante 20 anos em Luanda, vai ser demolido porque um qualquer empresario vai ali construir umas torres. Por vezes, o desenvolvimento e' mesmo uma grande merda.




You may also like

2 comentários:

Anónimo disse...

Lindo poema!! Quanto ao teu PS João, eu tinha um professor que dizia que o crescimento é o encher do copo e que o desenvolvimento é a gota d'àgua que transborda o copo. Nesta lógica, esses efeitos perversos do desenvolvimento é a àgua desperdiçada quando o copo transborda.

Abraço!

Anónimo disse...

Disseste tudo: "velho", "colonial" e "empresário". Infelizmente o património é, por aqui, visto como velharia que há que deitar abaixo para os empresários (que em Angola nunca são um qualquer) construirem as suas torres com telhados, janelas e portas de vidro. A baixa de Luanda, zona histórica por excelência, está a ser atirada aos predadores que lhe comem o físico e nos devoram a Memória. Tudo porque porque para os do topo, desenvolver é mesmo isso: construir elefantes brancos que desviam os olhares dos míseros rato que mesmo ali ao lado nadam no esgoto em busca de um pedaço inexistente de queijo para comer.