Um Café com Clarice

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O poeta cabo-verdiano Zé Cunha escreveu a propósito da última cafeína aqui publicada algo que gostaria de partilhar. Escreve ele, com a sabedoria certeira que lhe é característica que, à Clarice Lispector, "é preciso lê-la, pelo gozo de ler, pelo prazer da boa literatura, pelo dever de a conhecer, ou então, nem que seja para combater este gosto da frase feita, e das citações, que acaba por ser, muitas vezes, a morte de alguns autores às mãos do seu próprio veneno, ou o alfinete com que prendemos certas obras como borboletas num mostruário."

Clarice Lispector é uma escritora única, misteriosa, densa, que faz como poucos a autópsia da vida e do ser humano. Mostra-nos os nossas próprios intestinos e os órgãos em sangue com o mesmo espírito implacável e inquietante com que nos revela os segredos do amor ou as vicissitudes da alma. As suas citações são conhecidas e andam de mão em mão, agora que vivemos a era dos 140 caracteres, mas não se deixem enganar. A arca do tesouro de onde sairam essas frases é quase infinita. Pode-se viver uma vida inteira e o mais provável é continuarmos a nos interrogar, emocionar e, sobretudo, a tentar entender Clarice Lispector.

Ou como escreveu outro enorme poeta, Drummond de Andrade sobre ela:


"Clarice, veio de um mistério, partiu para outro.

Ficamos sem saber a essência do mistério. Ou o mistério não era essencial, era Clarice viajando nele. Era Clarice bulindo no fundo mais fundo, onde a palavra parece encontrar sua razão de ser, e retratar o homem.

O que Clarice disse, o que Clarice viveu por nós em forma de história em forma de sonho de história em forma de sonho de sonho de história (no meio havia uma barataou um anjo?) não sabemos repetir nem inventar. São coisas, são jóias particulares de Clariceque usamos de empréstimo, ela dona de tudo.

Clarice não foi um lugar-comum, carteira de identidade, retrato. De Chirico a pintou? Pois sim.
O mais puro retrato de Clarice só se pode encontrá-lo atrás da nuvem que o avião cortou, não se percebe mais.

De Clarice guardamos gestos. Gestos, tentativas de Clarice sair de Clarice para ser igual a nós todos em cortesia, cuidados, providências. Clarice não saiu, mesmo sorrindo. Dentro dela o que havia de salões, escadarias, tetos fosforescentes, longas estepes, zimbórios, pontes do Recife em bruma envoltas, formava um país, o país onde Clarice vivia, só e ardente, construindo fábulas.

Não podíamos reter Clarice em nosso chão salpicado de compromissos. Os papéis,os cumprimentos falavam em agora, edições, possíveis coquetéis à beira do abismo. Levitando acima do abismo Clarice riscavaum sulco rubro e cinza no ar e fascinava. Fascinava-nos, apenas. Deixamos para compreendê-la mais tarde.

Mais tarde, um dia... saberemos amar Clarice."

Para terminar: procurem saber mais. Leiam mais. E se a escolha recair em Clarice Lispector, se preparem. O impacto vai ser profundo.





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1 comentário:

Janaína Alves disse...

Adorei ser a culpada(penso eu) de despertar em vc essa paixão por essa mulher...
C.L.é uma diva...concordo com tudo isso que vi aqui sobre lê-la ,essa mulher é uma bruxa,uma feiticeira que uma hora ou outra no meio de suas frases de impacto vai lhe conquistar ,te trazer pra vida ,de mostrar a realidade nas coisas mais simples...fico meio trêmula de falar e ouvir falar nela...sou mais que uma fã e uma leitora...eu tenho um olhar quase CLARICE de
ser...
leia sim continuem desvendando os misteriosa dessa bruxa....pois garanto que assim amaram melhor e entenderam melhor até a alma feminina...
beijos distraídos.