Declaração Cafeana

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"Lolita", romance da autoria de Vladimir Nabokov, é uma das obras mais polémicas da literatura contemporânea universal. A obra mostrou-se demasiado arrojada para a moral vigente na época, tendo sido inicialmente recusado por várias editoras. Ao ser finalmente lançada, em 1955, por uma editora parisiense, gerou opiniões antagónicas: houve quem definisse o livro como um dos melhores do ano; houve quem o considerasse pornografia pura. Nos Estados Unidos, onde só viria a ser publicado em 1958, rapidamente conquistou o topo das listas de mais vendidos. O protagonista é o obsessivo Humbert, professor de meia-idade. Da cadeia, à espera de um julgamento por homicídio, ele narra, num misto de confissão e memória, a irreprimível e desastrosa atração por Lolita, sua enteada, de apenas 12 anos.

Tanto o livro como os dois filmes que lhe estiveram na origem, mostram uma criança que, devido ao tipo de educação e ambiente em que cresceu, se sente mulher antes do tempo, provocando, seduzindo, revirando o juízo de um homem quarenta anos mais velho, que viria a disputar com a própria mãe. A história termina tragicamente, e neste momento devem-se estar a perguntar a que propósito vem esta conversa.

Ora bem, ontem, num dos bairros periféricos da cidade do Mindelo, uma das ruas estava especialmente animada, com um "concurso" de crianças, todas do sexo feminino, entre os 5 e os 10 anos, com pouca roupa e pintadas como senhoritas, passando modelos e dançando músicas como "é o créu, é o créu", com as conhecidas coreografias correspondentes. Vários adultos, não se sabe se familiares ou estranhos, filmavam, excitadíssimos toda aquela cena, que provavelmente, nos tempos que correm, vai terminar num vídeo do Youtube. Não sei se o objectivo era organizar um daqueles sinistros concursos de beleza com meninas daquela idade - as mini misses - mas não é de hoje que considero este tipo de actividade "sócio-cultural" uma forma tão desagradável quanto eficiente de contribuir para se criar uma rede de montagem de futuras Lolitas que, é o mais provável, quanto tiverem 14, 15 ou 16 anos já estarão com um filho nos braços e a vida estragada nas mãos.



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4 comentários:

Valdevino Bronze disse...

Óh João!
Eu passei a minha adolescência (toda)em S. Vicente. Não é que essas coisas só acontecem em S. Vicente mas...
É um facto, e é preciso coragem para falar sobre isso. Dou-te os parabéns por isso!
É uma perspectiva aterradora para quem tenha a responsabilidade de educar os seus filhos... de uma forma diferente!
Abrx

Unknown disse...

Há cinquenta anos atrás, um JB da época tería, infelizmente, pintado um quadro idêntico! Talvez sem o modernismo do "desfile" de Lolitas potenciais, tudo o resto me trás à memória uma incómoda sensação de "deja vue"...
Zito Azevedo

Luís Tavares disse...

Lolitas sempre as houve e sempre as haverá.
Mas todos nós temos o dever e a obrigação de tentar minimizar a sua existência.
Esse tipo de concurso a que vc se refere também acontece um pouco por toda a Europa. Os fins podem ser os melhores, mas os aproveitamentos podem ser os piores.
Pessoalmente sou contra a ideia de transformar uma criança numa adulta. Mais contra sou quando associada a essa transformação está uma imagem sexuada implicita ou explicita.
Ah, mas isso está nas cabeças preversas de alguns tarados. Pois está! E o que falta por aí ( e por aqui) sou prevertidos a quem a Lei não é aplicada porque ... estão acima da lei.
É triste mas é verdade.

Ivan Santos disse...

falou e disse!!!tudo