Declaração Cafeana

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Se há alturas do ano em que tenho uma poderosa sensação do deja-vú é precisamente na quarta-feira de cinzas. Depois de anunciados os resultados do Carnaval mindelense ouvem-se as mesmas palavras de circunstância, as mesmas queixas, as mesmas justificações, as mesmas polémicas de sempre. Que não há organização, que não há união entre os grupos, que começa toda a gente a pensar no Carnaval apenas depois de refeita a ressaca das festas de S. Silvestre, que é preciso um museu para preservar o que de melhor esta grande festa popular produz todos os anos, que é preciso um pensamento mais sistematizado, ligando o Carnaval do Mindelo ao turismo, vamos fazer uma Fundação, os deputados vem para cá - em trabalho, claro! - para assistir in loco e dizer mais meia dúzia de banalidades, não porque não sejam importantes, mas porque são tudo ideias e afirmações que já ouvimos até à exaustão. Ou seja, o diagnóstico está mais do que feito: falta a coragem para se providenciar os meios que uma cura exige para este caso.

Por um lado, coloca-se a questão da organização dos próprios grupos. Que eu saiba, já houve uma Associação de Grupos de Carnaval, que chegou há alguns anos atrás a ter reuniões e encontros com a Câmara, mas como acontece quase sempre, o colectivo foi substimado, sem peso suficiente para fazer frente aos ideiais egocêntricos de cada um e tudo ficou como estava. Sempre que ouvimos qualquer pessoa ligada ao Carnaval - o jornal A Nação da semana passada falou com dois importantes nomes, Manú Cabral e Mick Lima - o discurso é sempre o mesmo, as queixas coincidentes. O pessoal do Carnaval trabalha e dá muito de si, sem dúvida, mas talvez não fosse preciso dar tanto se houvesse outra capacidade de organização e, porque não, um pouco mais de ambição, no que diz respeito ao Carnaval do Mindelo.

"O júri tem que ir para formação para saber o que é arte”, afirmou São Costa, a presidente de Sonhos sem Limite, e tem toda a razão. Ou melhor, do júri deveriam fazer parte pessoas qualificadas para avaliar determinados aspectos do desfile, que exigem algum preparo. Não posso afirmar se isso aconteceu ou não este ano, porque nem sei qual foi a composição do júri. Mas penso também que não é só o júri que devia "ir para a formação" (gosto da expressão, algo semelhante da que usamos quando dizemos que aquele rapaz deve "ir para a tropa", para ver se ganha juizo e se faz um homem): também ao pessoal criativo dos grupos não faria mal uma formação, mais ousadia, mais imaginação, mais criatividade, não apenas nos carros alegóricos, mas principalmente na organização do enredo e nos figurinos, nos últimos anos um pouco vira o disco e toca o mesmo.

Mais uma vez defendo que se devia fazer um levantamento para se saber quem são esses criativos, essa gente generosa e abnegada que já faz muito com muito pouco, mas que poderia fazer muito mais se tivesse possibilidade de adquirir formação de base em artes visuais, artes plásticas ou design. Feito esse levantamento, e em ligação directa entre a Câmara Municipal, os grupos de Carnaval e a M-EIA Escola Internacional de Artes, que se pusesse todo esse pessoal a estudar, aprender, evoluir. Estou certo que todos ganhariam, a começar pelo próprio Carnaval do Mindelo.

Na foto: rainha do grupo Flores do Mindelo, vencedor do desfile 2010




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11 comentários:

Isabel Victor disse...

Gostei de ler, como sempre ...

´Não dispenso este gostoso café (margoso)


Um imenso abraço


iv

Anónimo disse...

Concordo. Já começa a cansar a ladaínha de Quarta-feira dos carnavalescos.
E também a procissão de deputados para vir dizer ... o óbvio.

Ou então a crónica de um "opinion maker" que desde há data de anos por esta altura escreve uma crónica no A Semana com as mesmissimas conversas ... copy & paste

E já agora convém LEMBRAR que no próximo ano NÃO HÁ CARNAVAL em S.Vicente. Porquê ? Adivinhem ...

Unknown disse...

Isabel, obrigado

Pss, eleições?

Anónimo disse...

Eleições. Ou seja há eleições Logo não há desfile de grupos. Eu por mim acabava-se era com o Carnaval ... pois isso era a melhor coisa que se poderia fazer em vez de todos os anos estar a gastar rios de dinheiro.
Sim já estou a ver os milhares de apoiantes de carnaval a arregalar os olhos e chamar-me de inculto ....
Agora o que me espanta é haver taaaaaaaanta gente que gosta de carnaval e que acham aquilo o máximo e desde de 1991 isso é assim: ano que há eleições não há carnaval. E todos os anos ser a mesma lenga-lenga, vamos criar museus, vamos criar fundações, vamos criar formações, vamos arranjar mais "patrocinações", mas já na Páscoa (Quarenta dias depois dos prémios de Carnaval serem anunciados) a malta (ou será a maltinha) está noutra.

Sarabudja disse...

Não sou apoiante do Carnaval, mas caro Pss tenho lido os seus comentários e, na minha opinião, os seus comentários têm sempre um carácter de agência funerária: enterre-se a cultura, enterre-se o carnaval, enterre-se o cinema.
Os comentários soam, na minha opinião, a demagogiazita. Tirem-se o apoio à cultura, à arte, a tudo o que não é comida e enfarte-se quem não tem condições económicas. Talvez por distração minha, no entanto nunca o entendi como uma pessoa voltada para a construção de uma sociedade que valoriza outras áreas que são igualmente (a meu ver, até mais, para ser franca)enriquecedoras do que o vil metal. Ter uma coisa jamais pode ser deixar de ter outra.

Unknown disse...

Porque é que essas escolas de samba não se filiam ou tentam estabelecer laços de parceria com grupos carnavalescos do Rio de Janeiro ou de São Paulo? O actual embaixador do Brasil parece ser uma pessoa aberta a esse tipo de coisas, e porque não a possibiliadde dos principais mentorese staff do carnaval em Cabo Verde ( e não só Sóncent, pois em São Nicolau a tradição é ainda mais forte que São Vicente, cuidado...)Faltam políticas do Governo sim, mas também algum empreendorismo privado.

pimintinha

Anónimo disse...

os meus comentários têm sempre um carácter de agência funerária ? Não concordo. Eu diria antes que os meus comentários tem mais a ver com Agenda de Informações. Sim nese programa da RCV onde se lêm avisos assim "Fulana filha de Sicrana tem o doloroso dever de comunicar que faleceu ontem ... " Pergunta aos jornalista se é dá gozo fazer aquele programa?
De facto é "chato" mas são avisos que têm de ser lidos.
E se ninguém mais quer pegar nesses "avisos chatos" e lê-los eu não me importo de ficar com essa função. Claro que usando a comparação eu preferia que os meus comentários fossem comparados á Agência BCA de Rua de Lisboa, mas pronto ...
No entanto Agência funerária também serve. Em S.Vicente há muita coisa morta. E há que ter coragem para enterrar o que morreu, porque só assim sairemos dessa pasmaceira.

Sarabudja disse...

Caro Pss,
não lhe vou colar mais etiquetas na testa, embora me apeteça muito.
Se o fizesse estaria tão cheia de mim, tão certa de que estou absolutamente certa que me tornaria ridícula.
Porém deixe-me dizer-lhe que não partilhamos opiniões. - Leio-o neste Café e noutros blogs.
Há sempre visionários, mas esses destacam-se no sentido positivo, pois fazem, ressuscitam, têm ideias, apontam para o céu, muitos chegam às estrelas.
Isso de ficar sentado a agoirar mortes que lhe parecem anunciadas, é mais trabalhinho de abutre, de velha chatinha que está sempre a dizer: -"eu não tinha dito?" - e pronto, lá colei uma ou outra etiqueta. Sim, parece-me que estou mesmo com a ridícula mania de que estou certa!

Anónimo disse...

De facto não estou a ver como é que chegamos a este ponto mas cá vamos nós continuando a discussão que nem sei onde começou.
Se o outro comentário eu aceitei “na boa” este comentário aqui não tem sentido nenhum. Será capaz de indicar-me um comentário meu sobre alguma coisa com essa perspectiva de “eu não tinha dito” ?

De facto se há coisa que nunca faço nos meus comentários é dar uma de alienado. Dar uma de Corvo que está lá em cima pairando á espera que algo morra para vir atacar.

Eu ponho o dedo nas feridas. Eu critico quem ninguém ousa criticar. Eu defendo acima de tudo a minha ilha, S.Vicente, não defendo porém a cultura de Sab pa Cagá que quer ser imposta pela Pseudo-não-sei-quê de Rua de Lisboa e transervais.

Eu sou visceralmente cabo-verdiano atacando "os condutores e suportes institucionais na reformulação do passado colonial".

No entanto sou tudo menos abutre. Tal como disse defendo S.vicente mas não o faço como fazem outros que simplesmente vêm na ilha de S.vicente o expoente máximo da Cultura de “Sab pa Cagá”.

S.Vicente sempre foi e terá de voltar a ser outra fez mais do que é agora : o Provedor de Paródia e boa Vida. E isso que você me vê a criticar. É isso que me vê a combater com os meus comentários.

Abutre fica de longe a pairar na expectativa que haja mortes para depois aproximar.

Eu não, desde de sempre que estou na batalha e no chão. Ou seja estando na batalha se for necessário matar ... daí os comentários levarem por vezes flechas com veneno na ponta.

Não tenho nenhum problema em criticar com veemência os mortos-vivos que não deixam S.Vicente sair desta pasmaceira.

Eu não me coíbo de criticar ferozmente os “discutidores da merdinha enfeitada”, doa a quem doer.

Portanto há de me ver sempre a comentar neste estilo de lutador, neste estilo de batalhador. Se no outro comentário até achei piada, chamar-me de abutre já foi insulto.

Anónimo disse...

E já agora o comentário inicial sobre carnaval foi antes de mais um forma de espicaçar os mindelenses. De facto “as bocas” contra o Carnaval era para ver se aparecia aqui alguém a falar das grandes vantagens que traz para a ilha o grande investimento que é feito. Mas não. Não aparece uma alma capaz de fazer isso. A Câmara investe 7 mil contos só em prémios para os grupos. Qual o retorno desse investimento alguém discute? Népia. … Soncent e sab e sab pa cagá é a única coisa que interessa … anda pra ai alguém mais ou menos lúcido? Enche-se a garrafinha de pontche feito de grog mafe … e redobra-se a força com que se bate nos bombos incentivando ainda mais as pessoas a gritarem do fundo do seu ser “Soncent e sab e sab pa cagá op!”
Carnaval já acabou, apressemos e comecemos a falar depressa na próxima festança antes que o povo desperte e comece a enxergar a realidade. É assim que se vive Provider da Sabura e Boa Vida. É assim que se vive no Centro Nacional da Cultura de Sab pa Cagá : S.Vicente !

João Fortes disse...

queria deixar um comentário a cerca do Carnaval 2009,apesar de concordar com o baixo nível deste Carnaval,principalmente na criatividade.Devo comentar com franqueza ter visto melhor Carnaval em Mindelo.Não vou ser tão radical como o Pss nem tão negativista...Não devemos esquecer a grandiosidade do nosso Carnaval no passado nem compará-lo com o Carnaval de S.Nicolau pois quando eu nasci já se brincava Carnaval e a minha minha mãe,a minha avó...
Sobre a crítica dirigida aos artistas e criadores é bom relembrar que a grande maioria de artistas não participou neste Carnaval.É`preciso investigar primeiro.Existem artistas e artesãos com muito talento e que brilharam em outros carnavais.Eles não recebem prémios como as rainhas,Reis ou grupos.Aprenderam na Escola da vida artística Mindelense.Só conhecem o mundo da discriminação.Não foram estudar na M eia porque não conseguem pagar a dispendiosa propina.