Ilha

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Tu vives — mãe adormecida —
nua e esquecida,
seca,
fustigada pelos ventos,
ao som de músicas sem música
das águas que nos prendem…

Ilha:
teus montes e teus vales
não sentiram passar os tempos
e ficaram no mundo dos teus sonhos
— os sonhos dos teus filhos —
a clamar aos ventos que passam,
e às aves que voam, livres,
as tuas ânsias!

Ilha:
colina sem fim de terra vermelha
— terra dura —
rochas escarpadas tapando os horizontes,
mas aos quatro ventos prendendo as nossas ânsias!


Amílcar Cabral - Praia, Cabo Verde, 1945


Imagem: foto de João Barbosa, peça «Tertúlia», X Curso de Iniciação Teatral CCP





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2 comentários:

Eurídice Monteiro disse...

Olá João Branco

Aproveito para beber do teu café margoso, enquanto espero ansiosamente por um sinal no meu telemóvel.

O cheiro do teu café torrado me convida para entrar na ilha. E, logo, penso também num outro poema lindíssimo de que gosto tanto:


Rosa

Chamam-te Rosa, minha preta formosa
E na tua negrura
Teus dentes se mostram sorrindo.
Teu corpo baloiça, caminhas dançando,
Minha preta formosa, lasciva e ridente
Vais cheia de vida, vais cheia de esperança
Em teu corpo correndo a seiva da vida
Tuas carnes gritando
E teus lábios sorrindo...
Mas temo a tua sorte na vida que vives,
Na vida que temos...
Amanhã terás filhos, minha preta formosa
E varizes nas pernas e dores no corpo;
Minha preta formosa já não serás Rosa,
Serás uma negra sem vida e sofrente,
Serás uma negra
E eu temo a sua sorte.
Minha preta formosa não temo a tua sorte,
Que a vida que vives não tarda a findar...
Minha preta formosa, amanhã terás filhos
Mas também amanhã...
...amanhã terás vida!

AMÍLCAR CABRAL


Desejo-te uma boa semana!
Um abraço
Eury

Unknown disse...

Euridice: obrigado pela participação e pelo belo poema!

Volta sempre.