Tertúlia dos Mentirosos 71

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Um homem só, numa sala fechada com paredes metálicas à prova de som. Uma mesa e uma cadeira. O homem está sentado na cadeira. À sua frente, na mesa, uma folha de papel, uma caneta. Silêncio. O som de uma chave. A única porta existente abre-se. Entra um segundo homem.

- Então, já está?
- Já está o quê?
- O texto que tens que escrever, onde está? Essa folha continua em branco.
- Pois...
- Pois, uma porra! Tens que escrever!
- Mas...
- Nem mas nem meio mas. É um processo muito simples. Pegas nessa caneta e nessa folha e escreves.
- Mas escrevo o quê?
- Ainda não entendeste?
- Não.
- Escreves qualquer coisa.
- Qualquer coisa?
- Qualquer coisa.
- Qualquer coisa, como?
- Porra! Qualquer coisa, homem. Um romance, um poema, uma crónica, um blogue, uma crítica, um desaforo, qualquer coisa.
- Mas...
- Olha, estou a perder a paciência. Não tenho mais nada a sugerir-te a não ser isto: - [coloca uma pistola sobre a mesa] - se daqui a 15 minutos continuares sem produzir nada, dá um tiro nos cornos. Vai ser melhor para ti.
- Um tiro...
- Sim, um tiro. Bem no meio da testa. Não te preocupes com a sujeira. Depois limpamos tudo. Já estamos mais do que habituados, limpar a merda que os outros fazem. [Dirigindo-se para a porta]. Então já sabes...
- Estou sem nenhuma ideia. Vazio. Completamente vazio.
- [Por enquanto que sai] Olha, queres uma sugestão? Escreve sobre o estado da Nação. Está por este dias a ser discutido na Assembleia Nacional. Dará, certamente, uma excelente crónica.

O homem sai e fecha a porta. Ouve-se a chave que roda. Silêncio. Naquela sala fechada, de paredes metálicas à prova de som, apenas uma mesa e uma cadeira. Na mesa, um papel, uma caneta e uma pistola carregada.

- Escrever sobre o estado da Nação...

Pega na pistola e dá um tiro bem no meio da testa. Silêncio.




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4 comentários:

Unknown disse...

Escrever ou não escrever - eis a questão...Humor negro com aroma político, prisioneiro supliciado, condenado a duas mortes: escrever sobre o estado da nação (qual?...)- morte lenta - ou tiro na tola - morte instantânea... É o mesmo que condenar à morte um tipo que já morreu!
Zito Azevedo

Unknown disse...

Hahahaha Essa foi boa!

... disse...

Sempre é melhor morrer do que vegetar

Unknown disse...

Sem dúvida!