Café Mão Pesada

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Este é o texto integral de uma reportagem sobre a delegada Vilma Alves, do Estado do Piauí, no Brasil. É o terror dos homens com agá pequeno que acham normal bater nas mulheres. Desde que começou a actuar Vilma conseguiu baixar em 80% (!) a taxa de homicídios de mulheres no Estado,  e colocar o Piauí com a taxa mais baixa do país. 

O  texto é grande, mas vale bem a pena uma leitura. Uma lição. Notável.



O Piauí também é machista, só que aqui o trabalho é com eficácia. Na polícia não se deve cochilar. Não deixe a madrugada chegar, tem que ser imediato”, alerta a delegada Vilma Alves. 

Às 9h50 da manhã, a delegada recebe a denúncia. Às 10h05, ela liga para a Polícia Militar pedindo uma guarnição: “Uma senhora foi espancada e o marido quer matar. Ela está com medo de retornar e eu quero prendê-lo”, avisou. 

Às 10h20, um PM está na delegacia recebendo instruções. Às 11h05, a delegada já está diante do acusado, preso, na Central de Custódia de Teresina. 

Delegada: O senhor sempre bate nela? 
Acusado: Não. 
Delegada: Ela disse que já não aguenta mais, não quer mais viver com o senhor. O senhor está sabendo que quando sair não vai ficar com ela, não é? 

A pressa da delegada é a urgência do juiz. “Quando nos chega às mãos, a gente decide no máximo em 24 horas, talvez no mesmo horário do expediente”, afirma o juiz José Olindo Gil Barbosa. 

Uma azeitada articulação entre polícia e Justiça não deixa denúncias se acumularem. “Até em tom de brincadeira eu digo: ‘aqui no Piauí, a gente trabalha igual a pai de santo, a gente recebe, mas também despacha’”, diz o destaca o promotor Francisco de Jesus Lima. 

Na linha de frente dessa força-tarefa, uma mulher sempre perfumada, de brincos e colar de pérolas. “Como eu ensino as mulheres a andarem bonitas, a se amarem em primeiro lugar, então eu procuro andar sempre assim. Porque eu me amo”, ela garante. 

Sobre a mesa de trabalho, um salto plataforma modelo Lady Gaga. E outra mesa repleta de santos. “Os meus santos estão aí para me proteger”, diz. O resto é com a delegada: “Eu aprendi que remédio de doido é doido e meio. Mas dentro da educação, sem bater”, avisa. 

Com educação, mas falando grosso: “Aqui é olho no olho. Eu pergunto: ‘você comprou a sua mulher no mercado velho ou no shopping?’”. 

Em audiências informais, ela põe vítima e acusado lado a lado e dá lições de boas maneiras. “Eu não sei como você foi educado. Mas você precisa de umas pinceladas de como tratar uma mulher. Não se trata mulher na ponta do pé”. 

Não hesita em enquadrar um machão: “Como foi que começou? Olhe nos meus olhos! Como foi que começou essa droga?”. 

E deixa claro que ordem judicial é para ser cumprida: “Vamos resolver a situação. A situação é essa: ela não quer mais você. Está com um mês que separou. Como você foi lá? Preste bem atenção: você foi preso agora. Não tem mais direito à fiança. Porque se você voltar, você vai ser preso e vai diretamente para a penitenciária”. 

Não importa se a moça de olho roxo mora em bairro chique: “Nunca vi isso na minha família, na família dele. Os dois têm curso superior. Nossa família também tem curso superior. Classe média alta”, relata uma vítima. 

A delegada assegura: ninguém escapa do indiciamento: “Aqui é de tudo, político e tudo. Bateu, se faz o procedimento”, garante. 

Os movimentos feministas e o Ministério Público se uniram em campanha. E a própria delegada, professora de formação, vai aonde for preciso para passar o seu recado. 

“A mulher não é piano, mas gosta de ser tocada. Um beijinho no pescoço, um carinho. O certo é você chegar: ‘está aqui, meu amor, minha vida, meu perfume, minha rosa’. É assim! Quem foi que deu um cheiro na mulher hoje?”, questiona a um grupo. 

A Lei Maria da Penha é explicada ponto a ponto. “Se você estiver achando que você é dono de sua mulher, xinga a sua mulher, espanca todo dia, ela pode chegar na delegacia e dizer: ‘doutora, eu não quero mais, eu quero que meu marido saia’. E ele sai em 48 horas. Eu adoro fazer isso”, avisa. 

Os maridos ouvem atentamente o alerta final: “Se você forçar é estupro. E se ela chegar na delegacia e disser que você estuprou, eu lhe prendo, tranquilo, meu bem”. O resultado desse esforço coletivo é a queda da violência, mas se engana quem acha que os números do Piauí agradam a delegada. 

“Nenhum número é aceitável para mim. Nenhuma morte. Viver em paz é o que é importante. Como se admite uma mulher ser morta pelo seu marido? Porque a mulher não é mais coisa, não é objeto, não é propriedade. Mulher é cidadã e deve ser respeitada”, destaca.




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2 comentários:

Maria disse...

Nenhum textoo é grande quando se trata de violência doméstica.
Obrigada pela partilha!

redonda disse...

Parece ser mesmo uma grande Mulher!