Declaração Cafeana

24 Comments




No passado mês de Janeiro, escrevendo esta declaração cafeana, defendi que "as maiores guerras, as maiores torturas, as maiores injustiças foram cometidas em nome de algum Deus sob a capa de uma qualquer crença religiosa", confessando logo de seguida a minha condição de não crente. Entretanto. no lançamento do seu novo romance "Caim", José Saramago profere polémicas declarações sobre Deus e as religiões, que tem agitado os jornais online lusos, com a radical divisão de opiniões habitual nesta temática, uns concordando com o escritor, outros prometendo-lhe o fogo do Inferno no dia do Juízo Final.

Mas o que disse assim de tão grave José Saramago? Afirmou o que todos já sabemos, ou seja, que «as guerras de religião sabemos a tragédia que foram», considerando que «as Cruzadas são um crime do Cristianismo, onde morreram milhares e milhares de pessoas, culpados e inocentes, ao abrigo da palavra de ordem 'Deus o quer', tal como acontece hoje com a Jihad (Guerra Santa).» Saramago lamenta que todo esse «horror» tenha sido feito em nome de «um Deus que não existe», sendo esta última afirmação uma das que tem provocado maior polémica. Mas que raio, dizer que Deus não existe é tão ou mais grave do que afirmar que existe um Deus que determina o que é certo ou errado na nossa vida? Haverá neste assunto, verdades inquestionáveis?

Mas não se ficou por aqui. Quando chegou a vez de malhar na Bíblia foi um Deus nos acuda! «A Bíblia é um manual de maus costumes, um catálogo de crueldade e do pior da natureza humana», foi um dos mimos que lhe dedicou. «Sobre o livro sagrado, eu costumo dizer: lê a Bíblia e perde a fé!». O que há de ofensivo nestas declarações? É ou não é verdade que o Livro Sagrado está cheio de episódios sangrentos, de puro horror, muitos deles feitos em nome do Senhor todo poderoso? O que é mais ofensivo para os católicos: dizer o que disse o Nobel sobre a Bíblia ou romancear uma "teoria" em que se "prova" que Deus mais não é do que um super-computador com vida própria, como fez José Rodrigues dos Santos no seu romance "A Fórmula de Deus"?

Este é um daqueles assuntos que me fascina. E como diz o povo na sua infinita sabedoria há males que vem por bem ou então Deus escreve direito por linhas tortas e a verdade é que muitos defendem que estas declarações não são mais do que um excelente golpe de publicidade. E ao que parece resulta, porque fiquei cheio de vontade de ler o livro! E quem esteja a guardar um monte de labaredas para queimar o escritor em praça pública como se fazia com os hereges no tempo da Inquisição, guardem algumas munições para o nosso Mário Lúcio que acabou de inventar um Jesus que nasceu mulher e viajou perdidamente pelas ilhas de Cabo Verde!

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24 comentários:

Anónimo disse...

Eu sou daqueles que referes no último parágrafo. Ou seja isso de Saramago vir dizer o que diz sobre Deus e Bíblia num país católico é mesmo Uma GRANDE campanha publicitária.
O que ele afirma como quem descobriu a pólvora que as Cruzadas foram horríveis já é um lugar-comum. E que há guerras religiosas ... .. há alguma novidade nisso ? Deveria o Sr. Saramago era discorrer sobre o papel da Igreja nos diferentes barbáries que se cometeram nas Colonizações. Crimes que se cometeram na Escravatura.
Isso é que eu gostaria de ver o Velho a falar. Porque é que ele não fala do papel da Igreja na dizimação de aldeias africanas, ou aldeias de índios?
É claro que o Sr. Nobel vai para o caminho mais fácil não é?
Ou será que ele acha que o papel da Igreja nas colonizações foi somente de ensinar-nos a rezar o Pai Nosso?

Anónimo disse...

Como afirmou Philip Roth, em entrevista ao Público da semana passada, o Nobel não é para grandes escritores. Já o sabiamos, mas Saramago está cá para o demonstrar constantemente.
Filipe Costa

Unknown disse...

Paulo, pelo caminho mais fácil? Há quem diga que ele teve coragem de dizer o que muita gente pensa e não tem coragem de falar. Outros dizem que ele deu um brutal tiro no pé. Enfim, ninguém ficou indiferente. Dizer que foi o mais fácil, parece-me redutor, no mínimo.

Filipe, realmente, não chega a um metro e oitenta. Grande, grande é o José Rodrigues dos Santos...

hugo disse...

o saramago tem esta posição publica e literária) desde os idos anos 70. somente a repete, eventualmente com mais pompa... mas isso são sinais dos tempos, lá dizia o outro. mas é um tipo lixado, porque por um lado é comunista, por outro lado não é comunista. e quem não alinha nos rebanhos e tente usar a sua própria cabeça, normalmente lixa-se. a raiva da ignorância e a fúria do ego são forças estranhas são forças muuiittoo estranhas:)
abraço

hugo disse...

e outra coisa. e "nós que nada fazemos" porque é que metemos nos ombros desses "alguns que até fazem alguma coisa" o peso de terem a responsabilidade de terem que fazer tudo por nós, os coitados? isto de ser treinador de bancada das acções dos outros tem muito que se lhe diga...

ManuMoreno disse...

O meu Poeta/Escritor/Artista/Compositor ideal, sao aqueles que se metam na minha vida!

ManuMoreno
Kel Abxom Di kuraxom!!!

Unknown disse...

Subscrevo as palavras de Saramago e a sua coragem em dizer o que diz numa sociedade cyjos preceitos religiosos são altamente dogmáticos e retrógados. Pelo menos as opiniões de Saramago tiveram a vantagem de provocar a discussão, coisa rara quando se fala de dogmas religiosos.

Anónimo disse...

Quando eu disse caminho mais fácil é porque ele para fazer publicidade ao seu livro decide "partir a loiça" toda. Mas o Nobel não quebra loiças caras, parte é uns pratinhos e chávenas comprados num chinês qualquer.

zedeportugal disse...

Pergunta (sua):
É ou não é verdade que o Livro Sagrado está cheio de episódios sangrentos, de puro horror, muitos deles feitos em nome do Senhor todo poderoso?

Resposta:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Holocausto#N.C3.BAmero_de_mortos

Afirmação (sua):
"as maiores guerras, as maiores torturas, as maiores injustiças foram cometidas em nome de algum Deus sob a capa de uma qualquer crença religiosa"

Contra-afirmações:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Josef_Stalin#Deporta.C3.A7.C3.B5es

Pergunta (apenas como desculpa para uma conclusão capciosa):
Mas o que disse assim de tão grave José Saramago? Afirmou o que todos já sabemos (Quem são todos?), ou seja, que «as guerras de religião sabemos a tragédia que foram» (e sabemos também a tragédia que foram outras guerras feitas em nome da ideologia marxista que esse senhor professa)

Resposta:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Josef_Stalin#N.C3.BAmero_de_v.C3.ADtimas

Pergunta (minha):
Qual é o deus em nome do qual se fez este massacre?
http://pt.wikipedia.org/wiki/Conflito_de_Darfur

Fico a aguardar, com grande expectativa, uma resposta honesta de sua parte a este meu comentário, caro João Branco.

Pedro disse...

"Saramago lamenta que todo esse «horror» tenha sido feito em nome de «um Deus que não existe», sendo esta última afirmação uma das que tem provocado maior polémica. Mas que raio, dizer que Deus não existe é tão ou mais grave do que afirmar que existe um Deus que determina o que é certo ou errado na nossa vida? Haverá neste assunto, verdades inquestionáveis?"

E Saramago é inquestionável? Será um crime questioná-lo e criticá-lo por se querer fazer valer de dogmas, tais como "Deus não existe" para criticar outros dogmas?
Fala.se de "horror". E que tal os horrores perpetrados em nome do comunismo que para o Saramago continua a ser or egime ideal? Saramago vale-se do direito de questionar e abalar verdades absolutas, e nisso nonguém tem o direito de o calar, mas parece ficar sempre muito incomodado quando se questiona as verdades absolutas dele. Nisso é muito pouco original e enquadra-se na perfeição num perfil colectivo do racionalismo dogmático, cujos males ainda estão por apurar. Mas que rende um bons milhões de euros, isso rende.

Unknown disse...

Zé de Portugal, quer coisa pior do que justificar um mal com o outro? Ter havido o holocausto nazi justifica ou torna mais leves e aceitáveis as carnificinas bíblicas? Só se for na sua consciência! O facto de terem existido um filho da puta como o Staline ou Pinochet (e tantos outros ditadores) torna mais aceitáveis os crimes cometidos em nome do Deus católico durante as cruzadas ou a Inquisição? Em relação à sua última pergunta, bem, sempre pensei que Ele estaria lá em cima, no alto da sua infinita sabedoria, precisamente para impedir que acontecimentos horrendos como esse acontecessem no mundo dos homens. Mas pelos vistos enganei-me!

Pedro, não é questão de ser inquestionável. É o direito que ele tem à sua opinião, assim como você e eu temos às nossas. Obviamente, Saramago (nem ninguém) é inquestionável. Alguém o disse que era? Agora, mais uma vez, vir para aqui justificar um mal histórico com outro, como se uma mão lavasse a outra, não me parece um argumento válido. Mas devo dizer que este tipo de discussão, se for feita de mente aberta, pode ser absolutamente fascinante e estou convencido que todos crescemos com isso.

Paulo, dizer o que disse Saramago sobre a Bíblia não é propriamente "pegar leve", como indicias. Antes pelo contrário.

Pedro disse...

Caro JB

Lamento ter-me feito explicar mal e dar a entender que estou a tentar branquear ou lavar algum crime que seja. Para já não me cabe tal desiderato para o qual não estou preparado nem responsabilidade suficiente tenho nos crimes da história da Humanidade. O que contesto é a afirmação de que os maiores crimes da história tenham sido perpetrados em nome de um "Deus" e de uma ou outra "religião" e muito menos das conclusões que o JB e Saramago pretendem inferir deste pseudofacto. Por isso, não vejo porque o argumento de apontar outros exemplos de crimes históricos seja inválido nem se trata de aliviar consciências. O que está aqui em causa é um juízo de valor muito sério feito por um escritor. E quem faz juízos de valor dessa ordem deve contar ser contestado, com vários tipos de argumentos, cuja validade é sempre subjectiva - os argumentos são sempre válidos pois ninguém tem a verdade absoluta para os validar ou invalidar, já os factos não...

Unknown disse...

Pedro, acho óptimo que se discuta tudo. Sem problemas. Agora, por exemplo, eu posso achar um pouco redutor chamar, por exemplo, à Inquisição ou às Cruzadas de pseudofacto... E acho muito bem que se conteste com Saramago. Agora, ele está a falar da Bíblia e da religião católica, certo? Então, contestemos por aí. No dia em que ele estiver a falar que o comunismo é a melhor coisa que já existiu sobre a terra ou que o Stalin era um herói, também o poderemos contestar. E neste caso eu não duvido de que lado estarei, meu caro! Crimes contra a Humanidade cometidos em nome de um Deus ou de uma ideologia, para mim dá no mesmo.

zedeportugal disse...

Zé de Portugal, quer coisa pior do que justificar um mal com o outro?

João Branco: onde é que você leu no meu comentário que eu estava a tentar justificar um mal com outro mal?
Precavendo que pudesse ser tentado a fazer isso, eu pedi-lhe "uma resposta honesta" (ou uma argumentação honesta, que vai dar no mesmo) à pergunta: "Qual é o deus em nome do qual se fez este massacre?". Quando refiro "este massacre" podia referir-me a todos os que constam da dos registos históricos que linquei e muitos outros... infelizmente.

Só já no final do seu comentário/resposta afirma:
Em relação à sua última pergunta, bem, sempre pensei que Ele estaria lá em cima, no alto da sua infinita sabedoria, precisamente para impedir que acontecimentos horrendos como esse acontecessem no mundo dos homens. Mas pelos vistos enganei-me!

Enganou-se mesmo, certamente por estar pouco informado sobre o questão que quer aqui discutir. Se conhecesse a descrição da antropogénese segundo a Bíblia, saberia que Deus para nos criar verdadeiramente à Sua imagem e semelhança concedeu-nos o mais extraordinário dos poderes: o livre arbítrio. Quer isto dizer que o Homem ficou com o poder de escolher entre o mal e o bem, entre o certo e o errado, entre o construtivo e o destrutivo. Infelizmente, quase sempre escolhe o mal, o errado e o destrutivo. Deus não se contradiz: deu-nos a livre escolha, está dada. É pena aquilo que sempre fizemos e continuamos a fazer com ela.

Anónimo disse...

Eu continua a dizer que Saramago quer é que falemos dele e pelos vistos está a conseguir não é ? Ele disse asneiras (Bíblia é manual de maus costumes) e lugares-comuns (que as religiões provocam guerras). Portanto nada de especial nas afirmações, misturada com ataques á bíblia feito de forma pretensiosa. Aliás ele próprio utiliza o seu espaço para instigar e alimentar a guerra religiosa dizendo que a afirmação sobre a bíbia não iria ter grande impacto entre os católicos pois estes não lêm a bíblia ao contrário de outras religiões.

Unknown disse...

Ou seja, Deus lavou as suas mãos muito bem lavadas. Mas isso eu já sabia, meu caro!

P.S. Aqui não há ninguém que queria ser mais "honesto" do que ninguém... Apenas para que conste.

Virgilio Brandao disse...

O José Saramago é, nesta matéria, um inculto; triste e franciscanamente inculto.

O pior, é a dose de soberba que acrescenta à sua falta de cultura religiosa, e não só.

Abraço fraterno

o mundo visto daqui disse...

Sem dúvida um golpe publicitário; só que de tão repetido desde "O Evangelho segundo Jesus Cristo" que já não resulta, ou não seja a publicidade também uma aposta no insólito. Um sorriso e nada mais é a reacção de muitos ao Saramago repetido de mais um livro.
Que pena o Memorial do Convento não o ter convencido a ir por ali...

zedeportugal disse...

Ou seja, Deus lavou as suas mãos

Como sabe - ou, pelo menos já ouviu dizer - isso também não é verdade porque Deus tem uma tal misericórdia pela humanidade (ainda que humanidade nem sequer O respeite) que enviou o seu único filho, Jesus Cristo, e deixou que morresse para que pudesse continuar a amar-nos apesar das nossas iniquidades.
Talvez não entenda bem o que estou a tentar dizer-lhe quando afirmo que a maior dádiva de Deus foi o livre-arbítrio, ou talvez não perceba quando lhe digo que Deus ama a humanidade com um amor infinito. Por isso, apesar de não dispor de muito tempo, tentarei explicar-lhe com uma analogia que qualquer homem maduro (com filhos ou preparado para ser pai) pode compreender.
Um pai que ame verdadeiramente o seu filho não quererá passar a sua vida a fazer as escolhas do filho; ao contrário, educá-lo-á para que ele possa fazer a suas próprias escolhas, mesmo que o pai não concorde com elas.

P.S. Aqui não há ninguém que queria ser mais "honesto" do que ninguém... Apenas para que conste.

Estou certo que não deixou de perceber que eu falava de honestidade intelectual... digo-o também apenas para que conste.

Unknown disse...

Escrevi: "a verdade é que muitos defendem que estas declarações não são mais do que um excelente golpe de publicidade. E ao que parece resulta, porque fiquei cheio de vontade de ler o livro!"

Ao que parece não entenderam lá muito bem.

David disse...

Bem, seguindo esta lógica, tendo em conta que a maior parte das guerras são feitas pelos Estados (contra Estados) há que ser contra o Estado !!!
E já agora, associar o cristianismo à guerras é como associar o comunismo aos Gulags, um diz para não matar e mata-se outro diz querer libertar o povo oprimido e oprime, ora como é obvio ambas as duas ( o comunismo e o cristianismo) foram usadas como embalagem para políticas ( opressão, violência, intolerância...) a elas estranhas...
Já agora, é curioso que o senhor Saramago não tenha essa perspectiva critica em relação a filosofia ( o comunismo) que durante o século XX foi responsável pelo maior número de barbaridades ( Camboja, Correia...etc ), assaz curioso...!

Lily disse...

A Bíblia já foi tão "traduzida", tão "interpretada", tão "censurada" qu o produto final é um mistério...que tanto pode ser um conto de fadas como um livro de terror...se para uns é uma parábola, para outros será outra figura de estílo, conforme for a intenção.
Quem tem fé, continuará a acreditar, seja na Bíblia, no Al Corão, ou no que quer que seja... quem não tem, continuará a contestar.
Que foi 1 golpe publicitário, disso não tenho dúvidas. Se foi bem conseguido, isso já não sei.
Não vejo o comentário dele como algo assim tão "heroíco", como uma declaração bombástica exclusiva. Tantos criticam a Bíblia... simplesmente o mediatismo é diferente.

Unknown disse...

O primeiro livro em que Mr.Saramago se "meteu" com a igreja católica fez 26 edições...
Zito

Unknown disse...

Hahaha Essa foi boa, caro Zito! E diz (quase) tudo sobre a presente polémica.