Declaração Cafeana

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Escreveu esta semana o Zig-Zag do semanário A Nação: "Não se sabe se devido ao projecto para a oficialização da língua crioula ou do próprio Alupec, em si, mas o pessoal do Norte quer ver Manuel Veiga pelas costas." Esta frase, contempla, em poucas palavras, alguns equívocos pouco ou nada inocentes. Em primeiro lugar, porque os que tem vindo a criticar o actual Ministro da Cultura publicamente, fundamentando as suas posições, não o fazem única e exclusivamente fazendo referência ao crioulo, nem este é o principal móbil das análises críticas. Em segundo lugar, porque, curiosamente, os mais ferozes críticos de Veiga e sua equipa estão a Sul e não a Norte, como se pôde comprovar com o desassombrado pedido de demissão do Ministro que César Schofield fez em pleno directo na televisão nacional, no programa 180º, ou o texto da última crónica de Abraão Vicente publicada nesse mesmo jornal, na sua última edição.

Não vale, pois, esta tentativa de colocar as coisas como se isto - a contestação ao Ministro - se tratasse de uma guerra Norte - Sul, ou de prós e contras a oficialização do crioulo. Existe, certamente, um bairrismo doentio pungente e isso é visível nos fóruns online, cujo nível do discurso atingiu a escala do vómito - o que é espantoso tendo em conta que são fóruns com comentários "moderados"; assim como há, bem visível, uma divisão entre aqueles que defendem de forma vigorosa as diferentes posições relacionadas com o crioulo, divisão essa que não está necessária ou directamente relacionada com questões geográficas, porque alguns dos críticos do Alupec que tem escrito e assumido posições públicas são de outras ilhas, como o Fogo ou Santo Antão, havendo, por outro lado, cidadãos do Norte que defendem de forma descomplexada a oficialização do crioulo, entre os quais me incluo. 

Portanto, não coloquem panos e não tentem colorir esta triste e actual realidade com outras cores, porque o vendaval crítico que se sente em quase todos os quadrantes, de Norte a Sul, relativo às não-políticas do Ministério da Cultura e sua equipa, está relacionado com dois aspectos claros e directos: por um lado, a falta de paciência que já se tem para ouvir lenga-lengas repetidas até à exaustão e desacompanhadas de acções e mudanças concretas; por outro, a incompetência e o autismo que parece ter-se instalado na aplicação das políticas públicas para a cultura. E por falar em deserto, termino dizendo que tudo o resto, é areia para os nossos olhos, e dessa já temos nós que chegue vinda do deserto do Saara.
   
Imagem: Hiena




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4 comentários:

Tchale Figueira disse...

João eu disse que não faria mais comentários mas é para dizer a esta gentinha que deviam tomar umas lições de Caboverdianidade e Mundialidade com badius como o Mário Lucio, Arménio, J: Luis Tavares, Filinto Elisio. Abraão; etc etc etc malagueta. Só os jericos confundem incompetencia com bairrismo bacoco.

Neu Lopes disse...

"Existe, certamente, um bairrismo doentio pungente e isso é visível nos fóruns online, cujo nível do discurso atingiu a escala do vómito..."

João, esta foi muito forte mas sou obrigado a concordar plenamente.
Essa saga do crioulismo está a catapultar pseudointelectuais para um abismo abafado com um pano de seda chamado cultura.
Continuo a defender a minha posição: sou a favor da oficialização de língua cabo-verdiana, mas não da forma que se está a processar. Quero uma língua que seja de todos os cabo-verdianos e, para isso, é necessário que justiça seja feita, pondo de lado essas preferências por S. Vicente e essa luta desenfreada para oficializar o "crioulo de Santiago". O que é feito dos nossos patrícios do Fogo, do Maio, de Santo Antão, de São Nicolau, enfim de todos os cabo-verdianos?
Estamos nos tornando em ignorantes em ascenção num mundo globalizado, em que a variedade linguística é imperetrível e a necessidade de uma língua para comunicação global é imprescindível.
Oficialização do crioulo - necessário.
Ter maior cuidado com o ensino do Português - urgentíssimo!!

Tenho dito!

Tina disse...

Que haja vontade de oficializar a língua crioula, depois de tantos séculos de dominação estrangeira, entendo perfeitamente, embora ache que o país tem prioridades mais urgentes. Mas impor o Alupec, com regras perfeitamente distintas da maior parte das línguas que estudamos, é que não aceito. As crianças vão aprender a sua língua materna, que deriva essencialmente do português, com regras que as vão confundir quando forem aprender as línguas dominantes, que têm regras muito semelhantes entre si.
Reescrever a História é impossível, por isso temos que viver no mundo em que estamos e deixar de alimentar ideias estapafúrdias.
Quando revejo uma estória do Zizim Figueira, acima de tudo respeito o contexto em que ela se insere e procuro que as palavras sejam escritas da forma como é pronunciada nas ilhas que ele refere, embora respeitando a etimologia. Claro que dúvidas há muitas, mas como a base etimológica é igual, só falta aparecer um linguista com a cabeça sobre os ombros que estabeleça as regras básicas para escrever o crioulo, respeitando as diferenças entre as variantes. Afinal, não admiramos todos os escritores africanos que reinventam a escrita e nos oferecem livros de qualidade, como um Mia Couto, um Agualusa ou um Pepetela?
Nós, que somos em tão pequeno número mas considerados inteligentes, não conseguimos chegar a um consenso porquê? Que interesses estão instalados para que os debates sobre o assunto sejam de baixo nível, razão por que deixei de comentar nos jornais on line?

Tina disse...

Há uns tempos, eu dizia a uma amiga que, depois do Alupec ter sido oficializado, faltava um mero passo para a sua adopção como escrita oficial.

Agora mesmo, leio no rodapé da RTP África que o Alupec vai ser "divulgado" em todo o país...

Sub-repticiamente, já está! Além de saber que andou a ser ensinado, nos States por exemplo, antes de ter sido aprovado.

É o governo que merecemos, citando o filósofo e diplomata francês Conde Joseph-Marie de Maistre?