Declaração Cafeana

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Nos últimos meses aqui em Lisboa tenho tido a oportunidade de me cruzar várias vezes com a comunidade universitária cabo-verdiana. Nalguns debates promovidos - quase todos eles graças à fantástica dinâmica do grupo da Tertúlia Crioula, algo que seria vital reproduzir em território nacional - fiquei agradavelmente surpreendido com as intervenções do Rony Moreira, cujos textos no seu blogue Geração 20.j.73 aprecio bastante. 

No último encontro de José Maria Neves com universitários na capital portuguesa, Rony Moreira foi autor duma das interpelações mais originais da iniciativa, cujo teor não resisto em relatar aqui, de memória. O jovem recordou uma história que lhe acontecia quando chegava em casa: a mãe lhe pedia para que dissesse o que tinha feito de bom durante o dia ao que a criança respondia sem problemas. Fiz isto e aquilo, respondia orgulhoso. Depois, a mãe lhe dizia: agora fala o que fizeste de mal durante esse mesmo período. Era muito mais difícil.  Como admitir assim, do pé para a mão, os próprios pecados? Até no sagrado segredo do confessionário é complicado...

Pois bem, usando esta história, Rony Moreira voltou-se para José Maria Neves e perguntou-lhe: «senhor Primeiro-Ministro, já ouvimos muitas vezes o que o senhor acha que o seu governo fez de bom para o país. Agora eu gostaria de ouvir o que o senhor pensa que fez de mal e poderia ter feito melhor. Porque é muito mais difícil admitir os próprios pecados do que amplificar as nossas virtudes."

A resposta foi curiosa: "penso que na área da Cultura poderíamos ter feito um pouco mais." Lembrei-me imediatamente do Primeiro-Ministro português José Sócrates, que usou a mesma frase há uns meses atrás. Não me parece, em última análise, que a colocação da pasta da Cultura no mesmo ministério responsável pelo Ensino Superior tenha contribuído para melhorar esta performance e a verdade é que nesta área o vazio de ideias continua constrangedor. Umas das medidas imediatas da nova ministra foi a alteração do estado de coisas no Palácio da Cultura Ildo Lobo, na cidade da Praia, e os resultados foram visíveis e imediatos. O que vem comprovar que, se calhar, fazer mais e melhor, não será assim tão complicado. Ou é?




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3 comentários:

Paulino Dias disse...

Caro JB,

Li toda a entrevista, um excelente (e fiel, na minha opinião) retrato...

Gostaria de desafiar o Suzano para repetir aqui nestas ilhas a experiência do Tertúlia Crioula. Bem que precisamos - e muito! - deste tipo de experiência.

Abraço,
Paulino

David disse...

A resposta dada prende-se com a falsa noção que a admitir-se algum “mal-feito” a cultura é sempre uma realidade eleitoralmente neutra . O eleitor “normal” não se incomoda com tal assumpção de imperfeição, desde que haja, está claro, um festival numa praia qualquer… Assim não se fala da segurança, dos apagões e afins…

Paulino Dias disse...

JB,

Sorry, claro que o meu comentário acima era para ser colocado no post sobre o Suzano. Não sei onde andava com a cabeça eheheheh