20/08/09

Ah! Os Relógios



          Amigos, não consultem os relógios
          quando um dia eu me for de vossas vidas
          em seus fúteis problemas tão perdidas
          que até parecem mais uns necrológios...

          Porque o tempo é uma invenção da morte:
          não o conhece a vida – a verdadeira –
          em que basta um momento de poesia
          para nos dar a eternidade inteira.

          Inteira, sim, porque essa vida eterna
          somente por si mesma é dividida:
          não cabe, a cada qual, uma porção.

          E os Anjos entreolham-se espantados
          quando alguém – ao voltar a si da vida –
          acaso lhes indaga que horas são...

          Mário Quintana



Agradecimento ao Virgílio, do Terra Longe



4 comentários:

  1. O tempo por define a nossa vida em vez de ser a vida a definir o tempo...

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  2. "Só os mortos não morrem"

    Só eles a mim me restam, são tranquilos e leais
    os que a morte não pode matar mais com seus punhais.

    Ao declinar da estrada, no final do dia
    em silêncio se acercam, em sossego seguem a minha via.

    Verdadeiro pacto é nosso, nó que o tempo não desmente.
    Só aquilo que perdi é meu eternamente.

    Rachel Bluwstein numa tradução de Nuno Guerreiro Josué

    Quando leio isto penso no meu pai.

    Um abraço.

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  3. Entre outras artes, meu pai foi relojoeiro pelo que eu estou habituado a ver relógios desde que me conheço, a ouvir tic-taques, campaínhas e carrilhões, num sinfonia de sons e tons que sempre me encantaram...Temía pela vida de relógios esventrados, peça a peça, parafuso a parafuso, tudo muito pequenino, manejado à pinça de luneta presa ao olho direito, devagar, muito devagar, quase com carinho até retomar a aparencia inicial, para meu descanso...Eram objectos mágicos, de pulso, de bolso, de parede, de coluna. até de pendurar ao peito ou encrustado num anel de tamanho invulgar...Eram mágicos porque medíam o tempo que era coisa que eu não sabía bem o que era e, mesmo hoje, tenho as minhas dúvidas!
    Zito Azevedo

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  4. Mario Quintana in English
    Ah, Watches! (Ah, os Relógios!)

    Friends, to consult your watches will be useless
    when, someday, I am gone from your lives
    so lost in solving futile problems to survive
    they seem to be obituaries in progress.

    For time is an invention of death;
    it is unknown to life, true life, that is,
    when a single moment of poetry
    is enough to give us all of eternity.

    All of it, yes, because eternal life
    can only by itself be divided;
    it cannot be apportioned, bit by bit.

    And the Angels trade looks of bewilderment
    when someone —himself again, in the afterlife—
    happens to ask them: “What time is it?”…

    (translated by John D. Godinho)
    Ah, Watches! in The Color of the Invisible

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